A descoberta da rosa



Era uma vez uma rosa delicada e solitária por dentro. Assim como as outras flores emotivas, ela se doava mais do que recebia, cantava e sorria bem mais do que ouvia serenatas. Sua felicidade era condicionada a fazer o outro feliz. O objetivo de sua vida era cuidar de seu cravo, e não se importava de abdicar de seus sonhos mais dourados, para realizar os sonhos do ser amado.  Sua existência se misturava a dele ao ponto de não saber mais discernir gostos, características e pensamentos. Sua dependência emocional era tanta que, se o seu cravo morresse, ela morreria em seguida, pois não faria mais sentido sua vida. 

Até que um dia, ao perceber que seu cravo, mesmo solidário e com tanto carinho a oferecer, continuava a seguir o próprio caminho, ela resolveu passar a olhar mais para si, recordar seus gostos, conhecer novas flores, e, mesmo ainda um pouco distraída, continuar a desabrochar para a vida. Resgatou artes e remendou suas partes que encontrava pelas lembranças de quando era solitária também por fora. Voltou-se um pouco para dentro, passou a se entreter e a se reconhecer. Não temia mais ficar só, mesmo que sua vida às vezes parecesse dar um nó. O futuro passou a ser incerto, tão longe e, ao mesmo tempo, tão perto, ao ponto de se misturar com o presente. Ah, como é dura a vida da flor que tanto sente! Mas, talvez seja melhor muito sentir e acordar para si, do que não mais existir. 

Uma vez, num lindo jardim, passou por ela um cravo amigo. Ela não reconheceu seu sorriso. Estava tão entretida no mundo dos seus próprios sonhos, que pouco interagiu com o mundo real à sua volta. Registrou e admirou paisagens, mas não aproveitou a viagem. Sonhou demais, perdida em seu próprio tempo e não viveu preciosos momentos, decisivos e compassivos, que ficaram para trás e não voltam mais. Foi aí que percebeu que o mundo dos sonhos é mágico e sem igual. Tê-lo descoberto não fará mais sua mente retornar ao tamanho original. Mas é preciso acordar, voltar novamente a si no próprio labirinto, e enxergar a saída. Pois, por mais maravilhosa que seja a arte de sonhar, jamais será mais surpreendente do que a própria vida.










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